Em ato público, relembramos as mais de 130 vítimas das chuvas e negligência governamental em 2022
Movimentos sociais, coletivos, entidades, familiares, amigos e moradores de áreas alagadiças foram às ruas em ato simbólico, nesse domingo. A iniciativa aconteceu um ano após a tragédia que vitimou mais de 130 pessoas na Região Metropolitana do Recife (RMR), no período das chuvas de 2022, e refletiu a situação de abandono que pernambucanos ainda enfrentam.
A concentração iniciou na Avenida Rio Branco, no Recife Antigo. No local, organizações expuseram os inúmeros problemas habitacionais e cobraram por resoluções e soluções efetivas.
Em marcha, o grupo se dirigiu até o Marco Zero, no centro da capital pernambucana. Intervenções artísticas com flores, cruzes, cartazes e lama relembraram as inundações, deslizamentos de terra e soterramentos.
De forma pacífica, algumas pessoas passaram argila em seus corpos para representar a lama que destruiu vidas e sonhos. Foi um ano de luto, mas também de luta.
Mais de 125 mil pessoas ficaram desabrigadas ou desalojadas, como foi o caso de Fabiana Nascimento, analista financeira que morava em Jardim Monte Verde. “Meus familiares morreram. Suas casas foram destruídas, a Igreja da minha mãe também. Hoje, a minha casa está interditada e tenho que pagar aluguel. Era uma despesa que eu não tinha”, conta.
A assistente social Cristinalva Lemos, integrante do Programa Direito à Cidade do Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec), representou a instituição durante a solenidade.
“O grupo resolveu fazer o ato porque sempre estamos participando de reuniões, audiências públicas na Câmara dos Vereadores, na Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco e no Ministério Público; mesmo assim, a gestão não se movimentou para trazer proposições de obras que, de fato, previnam outras catástrofes”, aponta.
Os pedidos ao poder público não são de agora. A negligência em não ofertar políticas públicas para quem mora em áreas vulneráveis resultou em perdas irreparáveis. Não é possível ter de volta as vidas que se foram.
“Quem morre são as pessoas pobres, pretas e periféricas que não têm outra alternativa de moradia a não ser ocupar as áreas de risco da cidade”, complementa Cristinalva Lemos.
INTIMIDAÇÃO
Ao fim do ato, uma ação direta de intervenção no letreiro “Recife” no Marco Zero foi feita. De forma simbólica, argila foi colocada no local para representar a lama que trucidou famílias inteiras.
Policiais abordaram os integrantes no momento, mas os perceber que era argila, deixaram que o movimento se dispersasse.
No entanto, ao voltar para casa, Túlio Seabra, articulador social do coletivo Ibura Mais Cultura e que estava presente no ato, foi seguido, abordado e detido pela Polícia Militar. A acusação era infundada: danos ao patrimônio. Porém, com água, a argila sai sem dificuldades do letreiro.
Túlio foi liberado após prestar esclarecimentos. A Polícia realizou uma Verificação para Posterior Informação (VPI) que confirmou que o material utilizado foi a argila.
A Guarda Municipal do Recife tentou criminalizar um homem negro que participava, pacificamente, da honra em memórias às famílias vítimas do descaso do poder público.
Até quando estaremos submetidos à repressão do aparato institucional?
Até quando os territórios serão invisibilizados e marginalizados?
Até quando?
Confira abaixo a lista das instituições que estiveram no ato:
Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec); Habitat Brasil; Cooperativa Arquitetura Urbanismo e Sociedade (Caus); Grupo Mulher Maravilha; Praça do Cristo; Associação Gris Espaço Solidário; Fórum Popular do Rio Tejipió (Forte); Ibura Mais Cultura; Somos Todos Muribeca (STM); Cáritas Brasileira Regional NE2; Fórum de Mulheres de Pernambuco (FMPE); Conselho Regional de Psicologia; Articulação Negra de Pernambuco (Anepe); IBDU; Comissão Advocacia Popular da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Comissão de Direito Urbanístico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Centro Popular de Direitos Humanos (CPDH); Caranguejo Tabaiares Resiste; Centro Mário de Andrade; Greenpeace; Igreja Batista de Coqueiral; Instituto Solidare; FASE; e Articulação Recife de Luta (ARL).
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