A cultura popular e a educação resistem contra o racismo religioso
Em Jaboatão, o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa (21), em 2024, é marcado pelo Encontro Metropolitano dos Maracatus Nação. Participam do encontro: Maracatu Encanto do Dendê, Maracatu Camaleão, Maracatu Cabeça de Nêgo, Maracatu Nação de Oxalá, Maracatu Carneiro de Ouro e Maracatu Baque Forte.
A concentração acontece às 15h, na Igreja Matriz de Santo Amaro, de Jaboatão Centro e, às 16h, os maracatus seguem em cortejo até à Praça Nossa Senhora do Rosário. No local, a programação segue com o Sarau Coco do Rosário abrindo espaço para apresentações artísticas individuais ou coletivas. Coco do Rosário, Grupo Filhos do Oba Ynã e Coco do Catucá participam da tocada que homenageia mestre Toinho, referência em baque virado.
Saberes e tecnologias que compõem a identidade cultural Pernambucana, o maracatu e o coco são expressões populares posicionadas no enfrentamento à discriminação religiosa. O encontro dos maracatus é a manifestação da resistência ao longo dos anos.
Instituído pela Lei Federal nº 11.635, de 2007, 21 de Janeiro é o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. A data visa demarcar o direito à crença e ao culto, que apesar de garantidos em um estado laico seguem sendo violados.
A intolerância religiosa tem alvo
Segundo levantamento realizado pela startup JusRacial, em 2023, os tribunais brasileiros receberam 74.613 ações relacionadas a casos de racismo e intolerância religiosa. Em comparação com os números do primeiro levantamento, em 2009, que registrava 1.011 casos semelhantes, houve um aumento significativo de mais de 17.000% nos processos por racismo e intolerância.
O agravante dos casos pode estar relacionado à ampliação da consciência das vítimas e ao crescimento dos debates na agenda pública, em relação ao primeiro ano do levantamento, no entanto, conforme aponta pesquisa sobre as redes sociais, a internet se tornou um campo aberto para muitas dessas violações.
Em 2022, foram encaminhados à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos da Safernet mais de 74 mil denúncias de crimes envolvendo discurso de ódio pela internet. De acordo com a organização de defesa dos direitos humanos em ambiente virtual, os crimes por intolerância religiosa tiveram um aumento de 456% entre 2021 e 2022, ocupando a segunda posição atrás de crimes de xenofobia.
O estudo ‘Intolerância Religiosa e seus Reflexos nas Redes Sociais‘, produzido pelo Eixo Benguela, coletivo de diversidade racial da Ogilvy Brasil, combinou diferentes ferramentas e recursos de pesquisa online para tratar sobre discriminação religiosa nos meios digitais. A pesquisa revelou que as religiões de matriz africana são os principais alvos de ataques nas redes sociais. As agressões estão ligadas diretamente ao racismo. Como mostra os dados do segundo semestre de 2020:
62% das pessoas que registraram boletim de ocorrência por intolerância religiosa são negras. Desse total, 37% são adeptos do candomblé e da umbanda.
Por uma educação que transforma
Os números revelam a gravidade da opressão e perseguição que se manifesta contra a fé, sobretudo de origem negra e indígena. A negação e o desrespeito aos elementos que integram o sagrado de religiões como o candomblé, a umbanda e a jurema são uma incompreensão coletiva implantada e cultivada. São camadas profundas do racismo religioso e de rastros do colonialismo que estruturam a história do Brasil e são violentamente mantidos.
Promovendo o acesso à informação, a educação é uma das ferramentas mais potentes para o desenvolvimento do pensamento crítico e para a desconstrução do discurso colonizador; assegurada pela lei 10.639, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de "história e cultura afro-brasileira" dentro das disciplinas que integram as grades curriculares dos ensinos fundamental e médio.
É o trabalho realizado por Talita Emrich, professora e contadora de histórias que apresenta a mitologia dos orixás em escolas no Rio de Janeiro. Em vídeos no Instagram, a contadora divulga partes das aulas em que proporciona informações sobre a história dos orixás, sana dúvidas dos estudantes e estimula a reflexão sobre a importância e o direito ao estudo da cultura afro-brasileira. Através da educação, Talita constrói pontes que levam conhecimento e pensamento crítico a crianças e adolescentes.
Talita é um exemplo de que há formas de mudar a narrativa de intolerância no país. Realizar formações com educadores e familiares, estimular a igualdade quanto a presença de datas comemorativas religiosas nas escolas e incentivar o consumo de arte e cultura afro-brasileira são algumas das muitas maneiras de enfrentar o racismo religioso. É imprescindível priorizar o comprometimento de diferentes setores da sociedade, sobretudo poderes públicos, com o amadurecimento de medidas como a lei 10.639. Por uma busca da superação do eurocentrismo e do respeito à fé.
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