Confira as atividades realizadas pelo Cendhec no Mês dos Estatutos
“Eu gosto de flores. Na minha rua não tem muitas flores, só mato. Tem muito mato, mas eu ainda vou plantar um jardim”, disse Débora Vitória ao desenhar um grande girassol amarelo em uma folha de papel. A menina, de 6 anos, mora em Vila Independência, ocupação em Nova Descoberta, que há 20 anos resiste pelo direito à moradia. Além de Débora, outras 13 crianças e 10 adolescentes puderam expressar no papel o que gostam e o que não gostam em sua cidade, bairro e em suas ruas durante a oficina, promovida pelo Cendhec, realizada no Mês dos Estatutos. Mulheres do local também participaram de uma roda de conversa para debater assuntos como violência doméstica, habitação e saúde. No dia 15 de julho, com distanciamento social, uso de máscaras e álcool gel, as dinâmicas foram facilitadas por integrantes dos programas Direito à Cidade (DC) e Direitos da Criança e do Adolescente (DCA), do Cendhec, na escola Rotary em Nova Descoberta. O objetivo era entender como meninas, meninos e mulheres enxergam seus direitos e deveres na sociedade, além de falar um pouco sobre os aniversários e importância do Estatuto da Cidade e do Estatuto da Criança e do Adolescente. O primeiro completou 20 anos no dia 10 de julho; o segundo foi assinado há 31 anos, no dia 13 do mesmo mês.
As crianças e adolescentes foram provocadas a montar um mapa de Nova Descoberta, com as coisas boas e ruins que percebem em seu cotidiano. Ao desenhar o que achavam negativo, algumas retrataram insatisfações pessoais, como não gostar de ir a praia e festivais de pipa. Outras deixaram no papel elementos que dificultam a vida de toda a comunidade, como a poluição e pobreza. Com tintas e lápis de cor, Vitor, de 6 anos, representou o Coronavírus.
Nestas atividades ficam ainda mais claras as dificuldades que as crianças, adolescentes e famílias têm enfrentado em meio à crise sanitária da Covid-19. Maria Eduarda, de 8 anos, por exemplo, ao desenhar o que mais gostava, rabiscou uma escola. “O que eu mais gosto de fazer é estudar. Agora estou de férias, mas as aulas estavam sendo online. Até gosto de aula online, mas como tem tv lá em casa, é difícil de focar na tarefa. Às vezes dá vontade de ver mais TV do que aula”, comenta. “Por causa desse vírus, não posso ir pra escola. Tenho saudade de tudo, da professora, amigos e da merenda.”
Juliana Accioly, advogada do Cendhec, participou como facilitadora para as crianças de cinco a 12 anos e observou esses depoimentos de perto. “Foi bem interessante perceber o quanto que elas estão necessitadas desse contato físico, que foi diminuído por conta da pandemia, e a compreensão delas acerca do contexto do próprio território. Na dinâmica sobre o que gostam e o que não gostam, elas e eles trouxeram como boas as coisas as quais têm acesso, no caso a escola, casa e amigos. Mas elas não falam de espaços públicos, espaços de convivência, como praças, um parque... Isso condiz muito com o que a gente percebe dentro da comunidade”, relembra a advogada. “Outro fato que chamou atenção foi quando perguntamos sobre o que elas não gostavam, e muitas crianças trouxeram a pandemia, desenhando o coronavírus no papel. Às vezes, nós adultos achamos que as crianças de alguma forma não compreendem a realidade em que estão inseridas e tendemos a desconsiderar suas percepções, mas elas compreendem. Elas trouxeram o impacto negativo da Covid em suas vidas, isso me chamou atenção.”
Paula Ferreira, pedagoga do centro, ministrou a oficina com as/os adolescentes. “No sentido pedagógico, tentamos realmente compreender, por meio de uma atividade lúdica, como que cada adolescente e criança trazia o seu olhar para os aspectos positivos e negativos sobre a cidade”, comenta. “Os aniversários dos estatutos nos provocam muito a pensar sobre essa cidade e para quem ela é. Quem a constrói, quem usufrui dela e quem que não pode usufruir. Nessa oficina as meninas e meninos negritaram muitos dos desafios de se discutir habitação. Quando perguntei o que elas e eles gostavam e não gostavam na sua cidade, precisamos fazer um esforço para entender o conceito de cidade, para pensar em como estão transitando e percebendo esse local. Temos aqui, em bastante evidência, muito dessa herança colonialista que nós vivemos até hoje, em função do próprio racismo estrutural, que faz com que essas crianças não acessem direitos”.
A pandemia também afetou a qualidade de vida das mulheres de Vila Independência. Na roda de diálogo, muitas se queixavam de demissões, falta de uma rede de apoio, saneamento precário e aumento da violência. “Os diálogos foram muito ricos, as mulheres trouxeram falas muito fortes sobre as "faltas". Falta de políticas públicas para si e para as famílias, falta de moradia adequada, falta de política de saúde, de geração de emprego e renda, como acabam sem tempo para cuidar de si, e principalmente sobre a falta de segurança para as mulheres na cidade, nos territórios e na cidade como um todo. as mulheres trouxeram vários relatos sobre situações de violência contra a mulher que presenciaram e como se sentem inseguras para fazer denúncias, pois além da violência sofrida são revitimizadas por agentes de segurança e até mesmo pela própria sociedade”, relembra Cristinalva Lemos, assistente social do DC, que facilitou a oficina.
“Por fim aplicamos uma técnica de dinâmica de grupo que consistia em mostrar uma caixa decorada e dizer que dentro da caixa havia uma joia rara e de valor inestimável e à medida que o tesouro fosse sendo mostrado, cada mulher iria dizer se concordava com o valor inestimável da joia e que outras características faziam daquela peça única. Quando viam seu reflexo no espelho que estava dentro da caixa, a primeira reação das mulheres era de surpresa e aos poucos foram trazendo características suas que sustentava a tese de que realmente eram joias raras de inestimável valor, como batalhadora, esforçada, única, que nenhum dinheiro poderia comprar e que precisavam ser cuidadas. A partir dessas falas iniciamos uma conversa sobre a perspectiva de pensarmos em formar uma rede de solidariedade na comunidade com as mulheres, visto que as dificuldades e problemáticas são bem parecidas e ficamos de aprofundar o tema em outro momento”, completa Cristinalva.
Silvana Martins, de 37 anos, se sentiu livre para conversar e sugerir ideias para próximos encontros. “Eu aprendi que a nossa cidade depende da gente. Entendi que mulher é a maioria, que sozinha não consegue, mas unidas têm poder para mudar a situação em que vive”, comenta. “Eu achei ótimo. Até disse que deveriam vir aqui outras vezes pra falar sobre educação sexual, porque infelizmente temos pouco acesso, poucas informações sobre o assunto, sobre doenças sexualmente transmissíveis. Infelizmente os nossos governantes não fazem isso, poderíamos ter palestra nas escolas, né? Poderiam oferecer essas informações nos postos de saúde, mas infelizmente não temos acesso. Esses assuntos são muito importantes para adolescentes, principalmente para as jovens mulheres que ainda estão se formando.”
Como Silvana, o Cendhec também acredita na importância da informação para a formação e garantia de direitos. Por isso, com as oficinas, rodas de conversa e demais atividades promovidas pela ong ao decorrer deste mês, buscamos trazer a luz pautas de interesse social, afim de que juntas e juntos possamos desenhar um futuro de respeito, com políticas públicas voltadas a esta população. Estes encontros são sementes. Com elas o Cendhec quer plantar um jardim, parecido com o de Débora Vitória.
Mês dos Estatutos
Julho é especial para os Direitos Humanos, nele celebramos o aniversário de 20 anos do Estatuto da Cidade do Recife e completamos 31 anos da assinatura do Estatuto da Criança e do Adolescente. Por isso o Cendhec, com mais de três décadas de atuação para a garantia de direitos de meninas, meninos, moradoras e moradores de assentamentos, realizou uma série de ações voltadas para o fortalecimento da cidadania. Nos últimos 31 dias, tivemos lançamentos de livros, oficinas, matérias em nosso site e publicações nas redes sociais.
“Este é um mês festivo e de incidência para a ONG. Festivo porque temos dois marcos jurídicos muito importantes para defesa, promoção e proteção de direitos de grupos historicamente vulnerabilizados: as pessoas feitas excluídas do acesso à cidade e as crianças e adolescentes. De incidência porque é inerente ao CENDHEC e à sua raiz histórica, alicerçada na hombridade de Dom Helder Camara, a luta política em favor dessas pessoas vulnerabilizadas”, comenta o coordenador do Programa Direito à Cidade, Luis Emmanuel.
“Foi muito importante unir o DC e o DCA com atividades integradas de incidência política e participação social. As lives jurídicas cumprindo o papel de mobilização, resistência e controle social. Os lançamentos das publicações do DC e DCA como um produto de atividades, resultado de um esforço coletivo. E as oficinas sobre autoproteção do DCA com as crianças, adolescentes e as famílias, de forma híbrida, na perspectiva do empoderamento, do cuidado, afeto e proteção social. Julho foi um mês de mostrar que mesmo ainda de forma remota, podemos marcar presença nos espaços, dando visibilidade a questões sociais e as injustiças infelizmente tão presentes no nosso Estado”, completa Mona Mirella Marques, coordenadora do projeto Teia de Proteção, do Cendhec.
Confira o que foi produzido
Live de lançamento: Juventudes e Direito à Cidade: A Formação de Sujeitos Políticos
Este livro é o resultado da experiência formativa desenvolvida pelo Cendhec e Gecria/UFPE, com o apoio financeiro KZE/Misereor, junto aos/as jovens moradores/as de Zeis da Cidade do Recife. O objetivo é inspirar instituições e grupos de jovens na caminhada da formação como estratégia principal da construção de sujeitos coletivos e de direitos.
Para o lançamento, o Cendhec realizou uma live no dia 10 de julho, aniversário de 20 anos do Estatuto da cidade. A transmissão foi mediada por Luis Emmanuel, coordenador do Programa Direito à Cidade (DC) do Cendhec, e contou com as participações da pedagoga Paula Ferreira, do Programa Direitos da Criança e do Adolescente (DCA) e da assistente social Cristinalva Lemos, integrante do DC.
Baixe o livro: https://cutt.ly/tQdIyDJ
Vídeo de lançamento: Formação para autoproteção de Crianças: A Experiência do Projeto Teia
Neste livro o CENDHEC, em parceria com o Gecria/UFPE, pretende apresentar a metodologia da formação para autoproteção de crianças desenvolvida pelo Programa DCA com o apoio de KNH - A Kindernothilfe e.V., através do projeto denominado “Teia de Proteção”, cujo objetivo é estabelecer uma rede a partir da ampliação e fortalecimento da defesa jurídica e da assistência psicossocial, focada no atendimento e acompanhamento à(s) vítima(s) e sua(s) família(s) visando a responsabilização do(s) autor(es) da violência doméstica e sexual.
A publicação foi anunciada em vídeo, nas redes do Cendhec, com depoimentos de algumas das autoras do livro, Manuella Magalhães, Michelle Rodrigues e Ariana Santana da Silva; da coordenadora do Programa Direitos da Criança e do Adolescente e aoordenadora adjunta do Cendhec, Katia Pintor; de uma mãe, Mariana Lopes, e uma adolescente, Ana Luiza Passos, que participam do projeto; e de Flávia Regina Silva, coordenadora da KNH Brasil/NE.
Baixe o livro: https://cutt.ly/wQdIgjf
Os laços entre Cendhec e Vila Independência, ocupação em Nova Descoberta
“Sempre tive um laço afetivo muito grande com o Cendhec, por todo carinho que recebi, por toda equipe e por todo conhecimento trocado. Na minha visão, o Cendhec é uma instituição de extrema importância para a nossa sociedade, pois vem com o papel de defender os Direitos Humanos e passar todo conhecimento necessário para que lutemos pela garantia dos mesmos. Depois de tudo que aprendi, com uma visão mais ampla, passo os ensinamentos para meus amigos e familiares, afinal, como diz Francis Bacon, “conhecimento é poder”.
Foi esta confiança no Cendhec e seus 31 anos de atuação em prol das crianças, adolescentes, moradoras e moradores de assentamentos, que fez Isabelle Mikelle, 20 anos, moradora de Nova Descoberta, apresentar a organização sem fins lucrativos à Vila Independência. Os laços afetivos, aos quais a jovem se referiu, agora se expandem para as 190 famílias residentes da ocupação, que resiste há 20 anos pelo Direito à Moradia. Leia mais aqui: https://cutt.ly/1QdYihm
Identidade de gênero e Educação: pela afirmação da diversidade de existências
“A primeira lembrança que me vem logo à mente é de quando eu estava na alfabetização, com cinco ou seis anos de idade. Eram duas capas de prova com o tema junino: uma com o desenho de uma fogueira, bandeirinhas e um bonequinho vestido de matutinho e outra com a fogueira, bandeirinhas e uma bonequinha com vestes de matutinha. A primeira versão era entregue aos meninos e a segunda às meninas da sala de aula. Eu chorava porque pedia a das meninas mas a professora não me dava, me via chorando e achava que era birra minha, ela não tinha a compreensão nem capacitação profissional na época para poder lidar com aquela situação, sabe? ” O relato da memória infantil da manicure Alessya Rodrigues, a Leka, mulher trans, moradora do bairro do Cabanga, centro do Recife, hoje com 32 anos, diz respeito à uma de muitas de suas experiências que ficaram cristalizadas na sua trajetória estudantil. Assim como Leka, muitas outras crianças e adolescentes atravessaram ou atravessam situações parecidas no ambiente escolar. Imediatamente uma série de questionamentos, já diversamente amplificados na obra da pensadora Judth Butler, tais como: “A quem pertence o status de “humano”? Quais violências são percebidas?” vão coabitar as discussões, necessárias e urgentes, sobre identidades de gênero também no campo educacional.
Leia mais aqui: https://cutt.ly/fQdYYvc
Projeto Teia de Proteção: meninas, meninos e famílias longe do abuso sexual e violência doméstica
Nas últimas semanas, o Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social realizou oficinas com famílias, crianças, adolescentes, organizações sociais e demais integrantes da Rede de Proteção da Região Político Administrativa VI A (RPA6A), composta pelos bairros Boa Viagem; Brasília Teimosa e Pina. Os encontros foram ministrados por meio do projeto Teia de Proteção, do Cendhec, financiado pela associação alemã Kindernothilfe, e tinham como objetivo ouvir moradoras e moradores do Bode, no Pina, para a construção de novas inciativas e ações em prol desta Zona Especial de Interesse Social.
Leia mais aqui: https://cutt.ly/cQdYKT3
25 de Julho: dia das pretas, latinas e caribenhas; dia de rainhas
Angela Davis já dizia que “quando a mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”, então que se preparem para os terremotos. Para o Dia da Mulher Negra, Latino-Americana e Caribenha, o Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social, formado em sua maioria por mulheres, separou uma série de produções desta população. A ideia é que possamos escutar, ler, assistir e protegê-las sempre, não apenas nesta data. Garantir essa visibilidade é garantir a cidadania, é enxergá-las como detentoras de direitos e emancipadas pela arte e por suas próprias escolhas.
Leia mais: https://cutt.ly/2QdU734
Cendhec lança site Afrontosas com live "Vozes negras pelo direito à igualdade de gênero e educação"
Neste mês, o centro também realizou o lançamento do site “afrontosas.org.br”, plataforma criada pela ONG, com apoio do Fundo Malala, para agregar produção de conteúdos próprios sobre Direitos de Crianças e Adolescentes, gênero e educação pública, além de partilhar produções de redes de ativistas, coletivos, organizações sociais e das adolescentes como forma de influenciar políticas públicas que enfrentem desigualdade e discriminação de gênero, raça e classe social. Para a abertura do site, tivemos a transmissão “Afrontosas - Vozes negras pelo direito à igualdade de gênero e educação”, com a presença da pedagoga do centro Paula Ferreira e da jornalista Eduarda Nunes. A plataforma afrontosas.org.br é parte das atividades do projeto “Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas públicas para meninas”.
Visite o site: https://afrontosas.org.br/
O Cendhec
O Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social, organização não governamental sem fins lucrativos, tem por objetivo defender e promover direitos às crianças, adolescentes, moradoras e moradores de assentamentos populares e grupos socialmente excluídos. Na vanguarda dos direitos humanos e inspirados pelos ensinamentos de Dom Helder Camara, líder que dedicou sua vida à proteção de pessoas vulnerabilizadas, principalmente durante regimes totalitários, temos por missão contribuir para a transformação social, rumo a uma sociedade democrática e popular, equitativa, que respeite as diversidades e sem violência. Para contribuir com as ações desse centro tão importante para os Direitos Humanos, faça uma doação:
Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social
Banco 237 – Bradesco S.A.
Agência: 1230-0
Conta Corrente: 39630-3
Código Iban: BR86 6074 0123 0000 0396 303c 1
Código Swift: BBDEBRSPRCE
CNPJ. 24.417.305/0001-61
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